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O chato da turma
O chato da turma

É sempre assim. Entra ano e sai ano. Não importa se no ginásio, 2° grau, na faculdade ou no trabalho. Ele estará lá, ao seu lado. O odiado “colega chato”. Aquela “mala sem alças”, que critica todos a sua volta. Para ele, tudo o que você faz não está bom, mesmo que não consiga fazer melhor. O trabalho sempre estará faltando algo, sua apresentação não será suficientemente explicativa na opinião dele ou você não penteia o cabelo do jeito que ele acha que ficará melhor. É ele que fica ao seu lado, quando você está dirigindo, te dizendo qual o melhor caminho a seguir, mesmo que você já conheça o trajeto décor.

Não lembro o ano em que não tive que conviver com alguém assim, seja homem ou mulher. Na verdade, mulheres são naturalmente mais chatas do que os homens. Deve ser pelo fato dos hormônios se revoltarem com elas uma vez por mês.

O chato sempre se fantasia de melhor amigo e quando indagado o porquê de tantas criticas a seu respeito, sorridente e com a cara de pau, típica de quem só usa no rosto como “hidratante” óleo de peroba, diz que “são criticas construtivas!”. Construir é uma coisa, demolir é outra completamente diferente. Se bem que o engenheiro do Palace II, no Rio não sabe a diferença até hoje.

Existem várias formas de se falar algo que lhe incomoda em um amigo ou colega. Procure sempre analisar para ver como a pessoa receberá a crítica, se ela tem fundamento e se afeta outras pessoas. Porque, se você for o único atingido, como diz o dito popular “incomodados que se mudem”. E se depois dessas dicas o relacionamento com o seu (sua) colega chato(a) não melhorar reflita se não é você que está envelhecendo e ficando chato.

*Texto de Rafael Veloso, publicado originalmente no Guia Semanal de Ideias, do Caderno Dez!, do jornal A Tarde, em 4 de setembro de 2003.

Caderno Dez! - Jornal A Tarde 20/02/2003
A sobrinha-neta querida

Por Rafael Veloso*

Foi um período difícil para a família de Astolfo Albuquerque, proprietário da mais antiga fabrica de cortinas da Bahia. Pai pouco dedicado, “Seu Astolfo”, como era conhecido só pensava em ganhar cada vez mais dinheiro. Aliás, esse era o seu único prazer na vida. Nem o casamento de 53 anos com D. Amália, nem o nascimento de seus cinco filhos – três homens e duas mulheres, nem mesmo o nascimento de seu primeiro bisneto, foram mais importante do que a conquista de sua fortuna.

Seu Astolfo, se encontrava internado há 15 dias, no melhor hospital da cidade. Mas nem os melhores médicos e os tratamentos mais modernos adiantaram contra a ferocidade do câncer de próstata, que o vitimou. Um ano e meio lutando contra a doença e no sábado, em pleno carnaval, o velho resolve morrer. No velório concorrido, muitos empresários, políticos, funcionários e familiares prestando a última homenagem.

As filhas e a viúva enxugavam, com seus lenços franceses, as poucas lágrimas encobertas pelos óculos escuros. Diziam as más línguas que elas estavam tranquilas e inabaláveis, como se nem sentisse a morte do patriarca da família. Eis que adentra a sala onde estava sendo realizado o velório, a sobrinha-neta de Astolfo. Ciente da riqueza de seu tio-avó, a quem só vira uma única vez, como um furacão, começa sua dramatização. Aos prantos se atira sobre o caixão de alças banhadas à ouro.

– Oh vida cruel! Oh Deus, que castigo! Meu titio querido, tão novo – sendo interrompida por um dos filhos do defunto, que curioso para saber de quem se travará aquela figura, trajando um vestido longo prata brilhante e um arranjo de cabelo em forma de pavão, como se estivesse pronta para algum baile de carnaval, disse:

– Ele completaria 88 anos. Ela desconsertada, respondeu dizendo “que para Deus todos nós somos apenas criancinhas.”

– Desculpe, mas quem é a senhora? Era a pergunta que todos se faziam.

– Senhorita, por favor. Sou Ana Letícia Cristina de Albuquerque Alvarenga, a sobrinha-neta preferida do titio “Astó”.

– E única – retrucou o filho do morto, –  já  que a prima Elidia, sua mãe, só tem você.

E nesse pequeno tumulto, ouve-se um celular desesperadamente a tocar. E todo o ambiente que permanecia atônito com a chegada da sobrinha-neta, ficou chocado com o conteúdo da conversa.

– Oi Claudinha, querida, estou enterrando meu titio amado. Ah, mais claro! Claro que vou ver o Chiclete passar amanhã. E você acha que eu sou louca de perder essa oportunidade de ver o “Marquinhos”, o “Paulinho”, “Serginho”, “Eduardo Augusto”, o “Evandro Carlos”, todos os melhores partidos de Salvador. Só vai dar eu!!!

Caderno Dez! - Jornal A Tarde 20/02/2003
*Rafael Veloso é estudante do 1° Semestre de Jornalismo da FIB (Faculdade Integrada da Bahia). Texto originalmente publicado pelo Caderno Dez!, do jornal A Tarde, em 20 de fevereiro de 2003.