Dramaturgo lança projeto de música afirmativa para falar de homofobia e sorofobia
O ator, dramaturgo e diretor teatral baiano Luiz Antônio Sena Jr. agora inclui mais uma função ao seu currículo, a de cantor. Com o pseudônimo de LUI, ele acaba de lançar o seu primeiro EP, intitulado #ÉSóAmor. O álbum foi produzido por Bruno Michel, através da Candyall Music, selo e editora de Carlinhos Brown, e traz músicas dançantes e cheias de afirmação.
Já no primeiro single Comigo Ninguém Pode, composição de sua autoria em parceria com Thiago Pugah, o artista usa a metáfora da planta que dá nome a canção para levantar as bandeiras da homoafetividade e de combate a sorofobia, evocando o afeto e proteção à vida. A canção e o videoclipe que já estão disponíveis nas principais plataformas digitais.
“Essas relações de poder sempre me inquietaram. Talvez, pela minha própria narrativa: um homem gay, que nasce em Alagoinhas, uma cidade no interior da Bahia marcada por uma política coronelista ainda, um conservadorismo muito presente na sociedade, minha família católica e eu adepto da religião de matriz africana, sou iaô. Tudo isso, de alguma forma, está marcando minha existência no sentido de quais são os espaços que são abertos para mim e aqueles que são fechados por todas as escolhas que tenho de vida. Nesse sentido é que eu pensei em comigo-ninguém-pode como música de afirmação”, explica.
“O mundo às vezes me disse que eu não posso, que eu sou perigoso, que eu sou isso, que eu sou aquilo e o que eu tenho pra dizer ao mundo é eu existo, eu sou pleno, eu sou firme, eu sou resistente como esta planta”, afirma LUI.
Após quase 20 anos atuando nas artes cênicas como ator, diretor, produtor e dramaturgo, e depois da experiência de canto no palco com o espetáculo #ComproVendoTrocoAMOR, em que interpretava releitura de clássicos da MPB, foi que LUI resolveu se assumir cantante. “O desejo de ser cantor era algo que, de alguma forma, estava escondido a sete chaves dentro de mim. O teatro foi aos poucos me revelar essa possibilidade, mas nunca me colocando tão direto como um cantor, porque não acreditava em mim tanto assim ou negava essa possibilidade”, confessa o artista, que na pandemia viu esse desejo ser confrontado.
“Com a pandemia veio essa possibilidade da gente se olhar de frente para o espelho e entender ativamente quais são os nossos sonhos e quais são os motivos de nossa existência. Foi nesse sentido que eu comecei a perceber que a música estava muito presente em mim. Foi quando assumi que era o momento de mergulhar na música, tomá-la como uma presença e não como algo que completa um outro exercício artístico, mas ela como pilar, como algo que me faz existir”, ressalta LUI.
Agora, através do projeto #ÉSóAMOR, que engloba o lançamento de um EP com cinco faixas que trazem o amor como força motriz e matriz para afirmação dos corpos que dissendem da norma hetero, vem firmar sua personalidade e estética musical através de melodias e rimas próprias.
Quando perguntado sobre a parceria com a Candyall Music, LUI se derrete em elogios a Brown. “Quando a gente chegou para mostrar o projeto a Brown, ele, de cara, já ficou muito seduzido e eu pela possibilidade de também estar dentro do selo, pela proposta que foi feita de que não é somente a de colocar um EP nas plataformas virtuais. A gente tem pensado em um plano de carreira e neste sentido tem a grande maestria de Brown, com a sua carreira e tantos lugares, perpassando por tantos nichos e ao longo de tanto tempo. A parceria surge por uma confluência de interesses e desejos e, claro, que tem também a vontade de fazer juntos”, garante.
Próximos lançamentos
No último dia 18, foi lançada a música Enredo em parceria com o rapper Hiran. No próximo dia 9 de julho, chega as plataformas digitais a canção Positivo, feat com Dan Vasco, do grupo baiano Filhos de Jorge. LUI aposta nesta gravação para trazer à baila questões que ultrapassam a fronteira das minorizações sociais como é o caso da soropositividade.
Para os próximos meses, novas canções do EP #ÉSóAmor serão disponibilizadas. Estão previstas ainda o lançamento da canção autoral É Foda, além da regravação de Preciso Dizer Que Te Amo, música de Cazuza e Bebel Gilberto.
Mas, LUI também mantém planos para o teatro assim que as medidas de distanciamento social permitirem a retomada dos espaços cênicos. O ator, diretor e dramaturgo quer apresentar presencialmente o espetáculo virtual PARA-ÍSO, criado com o grupo Corre Coletivo Cênico. “É um espetáculo onde a gente faz uma correlação entre a epidemia HIV/Aids e a Covid-19. Tentando enxergar como os corpos que essa necropolítica escolhe extinguir, tendo em visto uma possibilidade de afirmação de uma comunidade imune, mas o que quê é essa imunidade, interessa a quem, quais são os corpos eleitos, quem pode ter acesso a isso”, questiona o dramaturgo, que também dirigiu e atuou na peça.
O espetáculo PARA-ÍSO estreou em formato digital com oito episódios, que estão disponíveis no YouTube. “O espetáculo foi feito dentro de um espaço alternativo aqui, de Salvador, que é a Casa Charriot e nosso desejo é não, necessariamente, fazê-lo num teatro, mas num espaço alternativo, onde a gente consiga ter uma outra experiência com público”, anseia.
Outro projeto do dramaturgo é uma adaptação para o teatro do livro Pequeno Manual Antiracista, de Djamila Ribeiro. “A gente ainda não tem previsão de quando vai estrear, mas é uma obra, que já estou me debruçando para escrever, que já tem um rascunho. Ou seja, tem muitas coisas que estão por vir, agora a grande questão é a gente poder se encontrar. Quero muito também fazer shows e sentir como meu som ecoando nesses corpos”, deseja LUI.
Ouça abaixo a entrevista exclusiva de LUI no episódio #02 do nosso podcast Destaques da Semana